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Cicloturismo em Cuba: pedalando na Ilha em momento histórico

Atualizado em 06 de janeiro de 2017
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Guia de turismo, jornalista e ciclista interessado em história e geopolítica, Arnaldo Bichucher percebeu que não dava mais para empurrar com a barriga a execução do projeto de sua quarta grande viagem de bike. Aventurar-se no cicloturismo em Cuba era uma oportunidade de satisfazer vários de seus muitos interesses.

Os passeios anteriores haviam sido percursos mais manjados entre cicloturistas, como os 800 km do Caminho de Santiago de Compostela, na Espanha, o tour de 500 km pela Córsega (local de nascimento de Napoleão Bonaparte, ilha italiana tomada pela França) e um percurso de 1.000 km pela Estrada Real, entre Diamantina e Paraty. A vontade de conhecer a originalíssima Cuba a bordo de uma magrela despontou com mais força em 2005. O noticiário que dava conta do mau estado de saúde de Fidel Castro e a aproximação diplomática, anunciada ao mundo em dezembro de 2014 por Raúl Castro e Barack Obama, tiveram o efeito de um “pedala, Arnaldo” na cabeça do jornalista. “Disse para mim mesmo: ‘é agora ou nunca'”, conta ele, por telefone.

Arnaldo ouviu com atenção o anúncio e anotou as datas. Programou então sua viagem aérea para Cuba um dia após o hasteamento da bandeira cubana em Washington, em julho de 2015. Foram 18 dias de pedal. A chegada a Havana se deu exatamente no dia 13 de agosto, aniversário de Fidel. E o jornalista deixou a capital da Ilha no dia em que lá foi hasteada a bandeira norte-americana. Por esse motivo, o livro que relata a viagem chama-se justamente “Entre bandeiras – Uma pedalada através da transição cubana”. O ciclista tem viajado bastante para divulgar o livro, com direito a parada na Bienal do Livro de São Paulo, e já trabalha na edição de um documentário que apresenta as belas imagens da ilha caribenha e entrevistas com o simpático povo cubano.

Em seu relato sobre o cicloturismo em Cuba, Bichucher procurou se esquivar de opiniões pré-concebidas sobre o regime castrista, tanto à direita como à esquerda, para conhecer pessoalmente a experiência socialista ilhoa. “Quis ir lá ver com os meus próprios olhos. Não quis ir a Cuba após a morte dele. É claro que outros ciclistas poderão fazer o roteiro que fiz, sem o menor problema. Mas aquele momento que vivenciei, entre o hasteamento de uma e outra bandeira, foi único”.

Caminhada em Santiago de Cuba em meio aos festejos de 500 anos de fundação da cidade, que coincidem com o carnaval num país de extrema riqueza musical; visita ao local do desembarque do Granma (iate que levou Fidel Castro e mais 81 revolucionários em 2 de dezembro de 1956 para o desembarque nas praias de Cuba); mergulhos nas deslumbrantes praias de Varadero e a chegada a Havana no dia do aniversário de Fidel são alguns dos pontos altos do livro. Mas passagens por locais ignotos e o contato com camponeses ofereceram também vivências interessantes.

“Durante uma pedalada pelo interior, com sol a pino, três matutos me ofereceram água e paramos para conversar. Fiquei impressionado com a quantidade de informações que tinham sobre o Brasil, as opiniões sobre a aproximação diplomática com os EUA e outros assuntos. Eram simples camponeses. Esse é apenas um relato que demonstra que as conquistas educacionais da Revolução Cubana são expressivas. Quando falo em educação, não estou me referindo a apenas ler e escrever, mas também ao nível de informação e capacidade de argumentar”, relata Bichucher.

O cicloturismo em Cuba revelou aos olhos do jornalista carioca que a Ilha é também um país sem moradores de rua, sem analfabetos, sem pessoas desprovidas de assistência médica. “Com sensibilidade jornalística e imparcialidade, tive a oportunidade de desvendar um povo e um país maravilhosos”.

 

 

Num país com poucos e velhos carros, as bicicletas são comuns, e Arnaldo sentiu-se por lá muito à vontade como ciclista. “Foi minha quarta viagem como cicloturista, e aquela em que me senti mais respeitado”. Na ocasião, o jornalista não abriu mão de pedalar sua magrela própria, mas comenta que havia um estrangeiro na Ilha que explorava o serviço de aluguel de bikes para cicloturistas. “Cruzei com um casal de norte-americanos que alugaram bikes”.

Arnaldo iniciou sua aventura pelo lado leste, cujo litoral ainda é pouco explorado turisticamente. Parte das estradas naquela região é precária e foi destruída pela erosão. Portanto pedalar uma bike que não seja off-road por lá é impraticável. É costume do turista, em suas rotas, optar por estradas secundárias, vicinais, e estas foram aprovadas pelo aventureiro.

Interessado em contemplar locais com importância histórica, como a Sierra Maestra, que serviu como base para os revolucionários, e a praia La Colorada, onde aportou o Granma, Arnaldo diz não ter ficado fadigado ao pedalar no relevo e variação altimétrica da Ilha. “Meu grande adversário mesmo foi o calor. Enfrentei temperaturas situadas entre os 35 e 38 graus centígrados”.

Entre os locais de pernoite, 60% deles estavam previamente planejados, com o auxílio de agentes de viagem cubanos. “Se não planejasse, não creio que teria grandes dificuldades. Há uma boa quantidade de casas particulares para aluguel. Devido à época que escolhi, poderia ter alguns contratempos por ser a época de férias dos cubanos, e algumas habitações ficam vazias”.

Por fim, Arnaldo, que trabalha com turismo receptivo no Rio, argumenta em prol da Ilha junto àqueles que decidem destinos baseados sobretudo em belezas naturais. “Muitos brasileiros sonham com o Caribe. Mas o Caribe que está no inconsciente coletivo do brasileiro se resume a Aruba, Cancún e Curacao. Lembro que Cuba é a maior ilha do Caribe. E, além das belezas naturais, tem grande riqueza histórica, arquitetura, gastronômica, musical, cultural”.