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Mobilidade urbana e planos para o MTB: o que pensa Gary Fisher?

Atualizado em 04 de setembro de 2018
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Gary Fisher, o inventor do mountain bike, é um homem atento ao que acontece pelo mundo e cheio de planos. Aos 67 anos, ele segue viajando pelo planeta para marcar presença em compromissos comerciais que envolvem sua linha de bicicletas de rodas de 29 polegadas (produzida pela Trek) e disseminar os benefícios de rodar sobre duas rodas.

No dia 24 de agosto, Fisher esteve no Festival Bike Brasil, que levou milhares de ciclistas e empresários do ramo a um centro de convenções de São Paulo, e conversou com a VO2Bike sobre a maneira como surgiu o mountain bike, a bicicleta como ferramenta de transformação da mobilidade urbana e os planos para popularizar o ciclismo pelo mundo.

Confira o vídeo e outros trechos da conversa:

VO2: Quando e como começou a sua relação com as bicicletas?

Gary Fisher: Muito cedo. Aos 4 anos, ganhei minha primeira bicicleta. Ela era vermelha, a ganhei no Natal. Foi como um sonho. Quando eu tinha 12 anos, comecei a competir. Eu via caras mais velhos fazendo isso. Eu queria me juntar a eles, que diziam que eu era muito pequeno para isso. No final de uma volta que demos, deixaram que eu me juntasse a eles, mas para ser um mascote. Um mascote? Então eu comecei a chorar [risos]. Aí eles disseram: ‘OK, OK, você pode ser um membro normal’. Foi assim que eu comecei.

Como surgiu a ideia de criar o mountain bike?

Eu era um ciclista de estrada. Mas eu tinha amigos na escola que me chamaram para ir para a montanha. Só que as bicicletas que usávamos tinham freios horríveis, não tinham marchas. Pensei: “Deveríamos colocar tecnologia nisso, porque é muito divertido”. Era muito divertido, mas você ia com seis caras e três voltavam arrastando a bicicleta.

Eu trabalhava em uma loja de bikes e pensei: “Eu consigo consertar isso. Posso colocar marchas e freios realmente fortes”. Eu conhecia todos os equipamentos que tínhamos na época, então fiz uma bike para mim. Em seguida, meu companheiro de casa disse: “Também quero uma”. Fiz uma para ele, para o amigo dele, para um outro cara da rua. Em pouco tempo, eu tinha feito umas 20 bikes. Pedalávamos todos juntos em Marin County, na Califórnia. Foi ali que eu vi que o mountain bike poderia ser algo grande.

E o que aconteceu depois?

Eu ainda era um ciclista de estrada. Essa ainda era a minha ideia principal. Eu queria competir nas Olimpíadas, no Tour de France. Então, em 1979, eu estava treinando no centro olímpico de Colorado Springs, quando o presidente Jimmy Carter disse: “Vamos boicotar as Olimpíadas de Moscou”. E eu pensei naquele momento que era hora de criar uma companhia de bikes. E a empresa que eu criei era chamada Mountainbike.

 

 

Comprar um carro foi um sonho para algumas gerações aqui no Brasil. De alguns anos para cá, algumas pessoas já não fazem questão de ter um carro na garagem e optam por andar de bicicleta. Como o senhor explica a diferença de mentalidade?

É uma coisa engraçada. Muito tempo atrás, nos Estados Unidos, a indústria automobilística vendia o carro como um sinal de progresso individual. E o que eles fizeram de verdade? Eles transformaram a ideia de transporte público em uma ideia privada. Isso significa que cada indivíduo teria que comprar seu próprio carro. Mas eles fizeram um marketing fantástico, dizendo que isso é que era progresso, que isso era o futuro do mundo. Agora, nós vemos 75, 100 anos depois que esse tipo de sistema não funciona.

Isso cria congestionamento. Não existe lugar na Terra, em nenhuma cidade da Terra, em que o carro funcione como deveria. Nas cidades em que ele funciona, como Tóquio, com 20 milhões de pessoas, você pode andar tranquilo. Lá tem um ótimo sistema metroviário e uma quantidade grande de bicicletas. E, claro, lá as pessoas andam bastante. E agora outras cidades estão aprendendo esse novo jeito. E estamos vendo que as cidades estão repensando o que estão fazendo.

E eles querem fazer um lugar… você sabe, há 100 anos, a cidade era um lugar bom para a família criar suas crianças, porque lá é onde o intelecto está. Nos anos 50, 60 e 70, começamos a sair das cidades para ir para os subúrbios para criar as crianças. As cidades se tornaram um lugar não saudável para criar as crianças. E esse é o ponto. A cidade precisa ser um lugar saudável para as crianças, porque aí você consegue atrair os melhores e os mais brilhantes, e então a economia cresce. Eles sabem disso. Nós vamos ter muitas mudanças nos próximos anos. O Brasil está incluído nisso.

Eu viajo há bastante tempo. Já fiz muitas viagens internacionais. Já visitei países de terceiro mundo, de primeiro mundo. Os chamados países de terceiro mundo têm pessoas que têm dinheiro, viajam e obviamente usam a internet. Eles veem tudo e sabem tudo. A internet espalhou conhecimento. Então é natural que algumas pessoas vejam coisas que acontecem lá fora e adaptem para os países de terceiro mundo.

Aqui no Brasil, o ciclismo ainda é um esporte de elite, praticado por poucas pessoas e com equipamentos caros. Qual é o caminho para popularizar o ciclismo pelo mundo?

O caminho é começar através das escolas, dos adolescentes de 13 a 18 anos. Nossa empresa, a Trek, está em uma grande missão. Queremos ter um time de corrida, um time de corrida de mountain bike em cada uma das escolas dos Estados Unidos. Isso significa 179 mil escolas. É maravilhoso.

Muitas dessas crianças não têm dinheiro. Muitas têm dinheiro e muitas não têm dinheiro. Uma das coisas que estamos tentando fazer é trabalhar com grandes empresas para criar uma bicicleta muito barata, que estará em um tipo de topo de vendas. No topo de vendas nessa classe de bicicletas de corrida.

Vamos introduzir essas duas coisas, tentando achar uma bicicleta que funcione como uma bicicleta de corrida e seja bem barata. E eu acho que deve haver um limite nessas bicicletas para que as crianças possam usar também em seus bairros. Tem que ser uma bicicleta mais razoável.

A inovação está em seu DNA. Há algumas décadas, você criou o mountain bike. Depois, desenvolveu as bicicletas de aro 29. Aos 67 anos, ainda há algo para ser feito?

Uma das coisas que nós estamos fazendo cada vez mais é a criação de espaços de mountain bike nas cidades. Eu vou fazer uma palestra em Dubai em fevereiro em uma conferência de mobilidade urbana. Vou sugerir uma coisa. Estamos construindo um dos maiores prédios do mundo em Dubai. E eu vou dizer: “Vamos construir um downhill que vai do topo até o chão”. Por que não? Nós podemos fazer isso. Nós temos a tecnologia para construir essa pista. E não há nada que possa te impedir de sentir que você é um gênio da bicicleta.