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Carteiro-corredor mira o bi na Uphill

O trabalho te consome? Sobra tempo escasso para desfrutar a família e treinar? A história do carteiro/corredor Marcelo Rocha, vencedor da árdua Mizuno Uphill Marathon no ano passado, comprova que dedicação, força de vontade e, sobretudo, amor ao esporte podem empurrar um atleta serra acima, a despeito das dificuldades impostas pela necessidade de ganhar o pão de cada dia. Esse perfil inaugura uma série que enfoca trabalhadores capazes de alcançar resultados dignos de profissionais.

Rocha, aos 44 anos de idade, é duro na queda. Funcionário concursado dos Correios, já progrediu na empresa e passou da fase de entregar correspondência montado numa bicicleta na cidade de Adamantina, na antiga região ferroviária da Alta Paulista, que engloba Marília, Dracena e Garça. Agora ele a distribui acelerando uma motocicleta, e recebe um salário melhor. O trabalho por cinco anos sobre a magrela, no entanto, lhe deu uma base física interessante, segundo constatação do próprio. “Pedalar em Adamantina é um sobe-e-desce danado. Claro que não se compara à Serra do Rio do Rastro, mas acabei construindo uma ótima base na raça”. A temível serra catarinense que abriga o percurso da prova se eleva a 1.421m.

A bicicleta, aliás, está ligada ao histórico desportivo da família Rocha. Antônio, irmão mais velho, montou uma bike para disputar provas ciclísticas na cidade natal deles, Tupã. Acompanhando Antônio, Marcelo se apaixonou pelo ambiente esportivo ainda criança. Mas um grande ícone da cidade, Minervino Leão de Souza, é que o direcionou para o universo das corridas de rua. Mas quem é Minervino? Já falecido, foi um ídolo que fortaleceu o orgulho tupãense muitas décadas antes de Tupãzinho, famoso filho da terra, entrar para a história como o autor do gol do primeiro título brasileiro do Corinthians. Atleta do São Paulo Futebol Clube, Minervino foi vice-campeão da São Silvestre no início da década de 40, antes da fase internacional da prova.

“O Minervino me serviu de inspiração e me incentivou. Meu irmão também. Quando me inscrevi na Corrida Rústica da cidade (1.200m), ele disse que era bom eu ganhar, caso contrário levaria um croque. Fui lá e ganhei”. Essa primeira vitória, em 1983, ocorreu quando Marcelo tinha apenas 11 anos de idade. “Logo peguei paixão e gosto pelo esporte”, acrescenta o carteiro.

Levando a sério os treinos, Marcelo progrediu muito e representou o Brasil no Mundial Juvenil de Cross de 91, em Antuérpia, na Bélgica. Porém, sem conseguir patrocínio nem retaguarda financeira para se dedicar exclusivamente ao esporte, ele rodou, atraído por perspectivas de trabalho, por Luiziânia, Lins, Brasília e Curitiba. Há sete anos, foi aprovado no concurso dos Correios, fixou-se em Adamantina e continuou sempre treinando e disputando provas no interior paulista.

Como normas internas impedem que os Correios patrocinem um funcionário, e Marcelo se diz sem tempo para montar um projeto e correr atrás de patrocínio, ele se vira, levando a vida dupla de carteiro e atleta. A empresa estatal , em tempos mais risonhos, até formou uma equipe de corrida, e promoveu uma série de corridas regionais para carteiros, bem como uma espécie de final nacional, disputada na Capital Federal. Com excelente preparo em comparação ao de seus colegas, Marcelo faturou o tricampeonato em Brasília.

“Infelizmente, hoje o apoio da empresa já não é mais o mesmo. Fico triste, porque não existe mais a Corrida do Carteiro”.

Com três filhos ainda crianças, o carteiro de 44 anos, no entanto, não tem tempo para se lamentar. Sem recursos extras para investir em suplementação alimentar, trata de comer adequadamente e é disciplinado nos treinamentos. Este ano, pretende baixar em oito minutos seu tempo na Uphill, e terminar na casa de 3h03. A prova será no dia 3 de setembro.

Como prêmio pela conquista do ano passado, Marcelo ganhou inscrição, passagens aéreas e hospedagem para correr a Maratona de Amsterdã, além de material esportivo da Mizuno, que deve durar até o final deste ano. Na Holanda, em outubro, quer um tempo de 2h25min. Com tanto esforço, alguém pode duvidar que ele chega lá?

 

 

 

Redação

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