Laboratório de Corrida

Como entender os diferentes tipos de tênis de corrida e sua evolução pode ajudar nos treinos

Escolher um tênis de corrida é um dos primeiros (e mais importantes) passos de quem quer começar a correr. Mas é bem nesse momento que a primeira dúvida surge para muita gente. Quais são e qual a importância dos componentes do calçado?  E como eles te ajudam em treinos e provas?

Todos os esportes têm equipamentos específicos. Muitas vezes eles não são obrigatórios, mas deixam a prática mais confortável e segura já que são projetados e fabricados pensando nos movimentos específicos e particularidades de cada modalidade.

É exatamente o caso dos tênis de corrida. A composição de cabedal, palmilha, entressola e sola é desenhada para deixar a corrida mais fácil, segura e estável. Na maioria dos casos, isso significa amortecer o impacto causado pelas passadas no asfalto. Mas não só.

Cada tipo de treino, prova, e até corredor, demanda um tênis diferente. Os modelos indicados para os treinos diários, quase a totalidade do mercado, costumam ter como grande característica o conforto do atleta. Essa sensação na pisada é garantida por dois componentes: a palmilha e a entressola do tênis, esta responsável pelo amortecimento, com a combinação de materiais que aliem maciez e leveza.

Na entressola, a maioria dos fabricantes usa a espuma de EVA como base de suas tecnologias, mas ela pode ser combinada a outros polímeros para atingir características específicas. Já a sola, parte do tênis de corrida que faz o contato com o solo, precisa ser de um material que garanta aderência, seja durável e não interfira no ‘trabalho’ da entressola.

“O corredor quer um tênis leve e a parte da entressola é responsável por 80% do peso do calçado, daí a importância da escolha dos materiais. Por isso criamos o ENGAGE (TM), um elastômero que modifica o EVA e que reduz pelo menos 10% do peso total do sistema sem prejudicar as outras características de desempenho”, explica Janine Carvalho, gerente de marketing para o mercado de calçados da Dow na América Latina. “Quanto mais deste material na composição, mais leve”, reforça.

Os tênis para treinos diários e provas longas costumam ser mais altos, exatamente por terem uma entressola mais robusta. A flexibilidade é outro fator que ajuda na sensação de conforto, já que influencia diretamente na liberdade de movimento do pé dentro do calçado.

“Um tênis de corrida para uso diário é aquele com mais estrutura, mais amortecimento. Ele é mais estável e tem uma vida útil maior”, explica o consultor de tênis de corrida Rodrigo Roehniss.

Uma vida útil maior do calçado está relacionada com a menor deformação da entressola e menor desgaste na sola, principalmente nas zonas de atrito com o piso. As novas tecnologias retardam o processo de deformação permanente do material causado pelas sucessivas passadas e fazem a entressola retornar a sua posição inicial mais rapidamente, o que diminui o intervalo necessário entre cada uso.

Já ouviu que não se deve usar o mesmo tênis todo dia? É por causa desse período de retorno do material, que se não for respeitado pode diminuir sua vida útil. As novas tecnologias em materiais para entressola reduzem este período que pode ser contado em horas e não mais em dias.

Além do amortecimento em si, vale ficar de olho na hora de comprar no material do cabedal (a parte de cima) do tênis de corrida. Quanto mais leve e arejado o tecido, maior a tendência de o tênis ser confortável mesmo depois de alguns km de treino.

Diferentes tipos de treino, prova e atletas exigem tênis diferentes

Mas se os tênis de corrida costumam ser mais altos para privilegiar o amortecimento, por que às vezes vemos grandes atletas disputando provas com tênis baixos e praticamente sem amortecimento? Esses são os modelos de performance, que prezam pelo desempenho e velocidade.

Em vez amortecer o impacto, os tênis de competição, como também são chamados, são projetados para oferecer maior resposta ao atleta. Em resumo, utilizar a força que ele aplica sobre o chão para impulsioná-lo para a frente, o que tem o nome técnico de efeito rebote. Diferentes combinações de materiais fazem com que este efeito seja maior ou menor.

“Para tênis de alta performance, usa-se polímeros mais elastoméricos combinados ao EVA e em maior quantidade, como nossas tecnologias ENGAGE (TM) e INFUSE (TM). Além de reduzirem o peso, elas promovem uma reposta de impulso imediato maior à entressola. É como se o material absorvesse a energia que recebe do corredor na pisada e devolvesse aos pés dele.”, afirma Janine Carvalho

Os tênis de performance costumam exigir mais fisicamente do corredor, assim como uma técnica de corrida extremamente apurada.

“O melhor jeito de o atleta, mesmo iniciante, identificar o quanto de conforto o tênis proporciona é calçar na loja e dar alguns passos, um pequeno trote, e ver se o tênis atende o que ele busca”, explica Roehniss – muitas lojas especializadas em corrida têm esteiras exatamente para o atleta testar os modelos.

Uma mudança para cada necessidade

Os modelos de corrida e essa busca por conforto ou performance fazem parte da história da modalidade, mas o protagonismo do tênis na vida dos atletas (amadores e profissionais) cresceu junto com o esporte.

Um dos momentos emblemáticos ocorreu em 1961 quando o etíope Abebe Bikila, que tinha conquistado descalço a medalha de ouro da maratona dos Jogos Olímpicos de Roma 1960, venceu a Maratona de Osaka utilizando um tênis da japonesa Onitsuka Tiger (atual Asics) – foi a primeira prova que ele ocorreu calçado, o que chamou atenção global para a marca esportiva e seus produtos.

Já em 1971 Bill Bowerman, um dos fundadores da Nike, criou a sola em formato de waffle para os modelos da companhia – ele teve a ideia enquanto tomava café da manhã em casa e usou a máquina de waffle da família para fazer o primeiro protótipo do design. O Waffle Trainer chegou ao mercado em 1974 e colocou a Nike entre os principais fabricantes de tênis de corrida do mundo.

Pouco tempo depois, outra marca americana traria uma evolução tecnológica vista até hoje nos pés de atletas.  O Brooks Vantage, lançado em 1977, foi o primeiro modelo para corrida a ter a entressola feita em EVA – mais de 40 anos depois, o material ainda é o padrão da indústria esportiva para amortecimento.

Uma nova grande mudança na abordagem dos fabricantes para os tênis de corrida veio apenas em 2009, quando a Hoka One One apareceu no mercado e criou o segmento dos tênis maximalistas. Os modelos com entressolas extremamente altas, macios e que privilegiavam o conforto conquistaram rapidamente o público e ditaram a tendência atual do mercado.

Um dos capítulos finais dessa evolução, por enquanto, veio em 2017, ano em que a Nike desenvolveu o projeto Breaking2 para tentar fazer um homem correr a distância da maratona em menos de 2 horas pela primeira vez na história.

Entre as inovações desenvolvidas pela empresa para o desafio, a colocação de uma placa de carbono na entressola do Vaporfly fez sucesso e inspirou outras companhias a adotarem tecnologia semelhante em modelos de competição.

As evoluções dos materiais e da indústria são ditadas pelas necessidades do corredor. Conforme os desafios evoluem, buscam-se respostas nos laboratórios e fábricas. Tudo para você melhorar na rua.

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