Por Leandro Bittar
O multicolorido pelotão do World Tour já roda pelos quatro continentes do globo desde o primeiro mês de 2015. A grande expectativa desta temporada parece ser completar o destino que as inúmeras quedas e imprevistos médicos frustraram em 2014. Será um remake de vários episódios incompletos: Contador versus Froome; Kittel versus Cavendish; Valverde, Purito, Urán e Porte versus o sonho de uma Grande Volta; Nairo Quintana e Vincenzo Nibali em busca da afirmação; os franceses e os italianos tentando renascer… Os pilares são os mesmos, mas nada é exatamente igual e, muito menos, previsível.
A proposta indecente de Tinkov
O russo Oleg Tinkov é uma figura excêntrica e ao longo dos anos tem mostrado uma língua cada vez mais afiada. No final do ano passado ele prometeu um prêmio aos principais ciclistas do Pro Tour (Froome, Contador, Quintana e Nibali) caso eles topassem competir as três Grandes Voltas. Ninguém levou o plano muito a sério e ele também não entrou muito em detalhes. Porém, sabe-se que Alberto Contador sonha com essa façanha faz algum tempo e não haveria forma melhor para aumentar suas chances do que colocar seus principais rivais em condições de igualdade (ao menos no quesito cansaço). Mesmo sem o “campeonato interno” de Tinkov, o espanhol já anunciou que vai tentar a dobradinha Giro-Tour, algo que ninguém consegue realizar desde Marco Pantani, em 1998. Na Itália deve pegar rivais de nível inferior, com Richie Porte (Sky) tentando recomeçar de onde parou no ano passado, em busca de se tornar um homem de Grandes Voltas. O jovem Fabio Aru (Astana) e o colombiano Rigoberto Urán (Ettix), ambos no pódio em 2014, completam o quarteto de favoritos.
Se tudo correr bem, o Tour de France terá os grandes nomes reunidos mais uma vez. Mais ainda do que no ano passado, o start list promete muitas estrelas. Jovens e veteranos aspirando à camisa mais cobiçada do ciclismo, a amarela, de líder da classificação geral. Com Quintana (Movistar) — ausente em 2014 — e Nibali mais maduros e motivados, um Froome sedento e uma esquadra francesa cada vez mais empolgada, não há como esperar algo aquém de uma grande disputa. Mesmo sem vencer a prova desde o flagrante por Clembuterol, Contador continua franco favorito. Porém, vale lembrar os inúmeros tombos na primeira semana do Tour 2014, que ceifaram Froome e Contador da disputa.
Três dos seis campeões do Tour em atividade no ano passado anunciaram aposentadoria e não estarão na prova: o australiano Cadel Evans (2009), o luxemburguês Andy Schleck (2010, após a eliminação de Contador) e Wiggins (2011), que irá focar em uma preparação para as provas de pista após a Paris–Roubaix.
Fecha a trinca das Grandes Voltas a Vuelta a España. Como sempre, seu start list pode ser engrandecido pelo desenrolar das irmãs mais velhas. A princípio, os grandes nomes continuam sendo os espanhóis Alejandro Valverde (Movistar) e Joaquim Purito Rodriguez (Katusha). Grandes surpresas, entretanto, são comuns na prova espanhola e um dos nomes que mais reúne expectativa, desde já, é o polonês Rafa Majka (Tinkoff), que deve ser o líder da esquadra se Contador, por falta de opção ou por ego, não quiser defender o título. Majka foi Rei da Montanha do Tour de France, com duas vitórias de etapa, e também tem dois top 10 nas duas últimas edições do Giro d’Italia.
Um destaque que pode ser influente nessa temporada são os reforços de peso realizados pelos times ProContinentais, aqueles que só disputam as principais provas quando convidados. A MTN-Qhubeka apostou em ciclistas com currículo, porém de futuro nebuloso, como Matt Goss, Tyler Farrer, Theo Bos e Edvaldo Boasson Hagen. A Nippo-Vini Fantini também apostou em um medalhão e tirou Damiano Cunego da Lampre. Já a Southeast, novo nome da esquadra do brasileiro Rafael Andriato, trouxe o veteraníssimo Alessandro Petacchi, 41, ciclista em atividade com mais vitórias no currículo.
RAIO X 2015
Menos um
Com a fusão da Garmin e da Cannondale, o World Tour terá uma equipe a menos que no ano passado. Serão 17 times:
Ag2r-La Mondiale, Astana, BMC Racing Team, Etixx-Quick Step (antiga Omega Pharma-Quick Step), FDJ, IAM Cycling (nova equipe), Lampre-Merida, Lotto-Soudal, Movistar Team, Orica-GreenEdge, Team Cannondale-Garmin (fusão das equipes, mas base e comando da antiga Garmin), Team Giant-Alpecin (antiga Giant-Shimano), Team Katusha, Team LottoNL-Jumbo (antiga Belkin)
Team Sky, Tinkoff-Saxo, Trek Factory Racing
Saiu…
A Europcar, que apesar do bom desempenho de Pierre Roland, teve um grande corte de investimentos. Mesmo assim, o time deve estar nas principais provas, notadamente do calendário francês.
As principais contratações
Peter Sagan e Ivan Basso (da Cannondale para a Tinkoff)
Nacer Bouhanni (da FDJ para a Cofidis)
Bauke Mollema (da Belkin para a Trek)
Leopold Konig, Nicolas Roche e Elia Viviani (para a Sky)
Alessandro De Marchi (Cannondale para a BMC)
Os aposentados
Jens Voigt (ex-Trek)
Thor Hushovd (ex-BMC)
Andy Schleck (ex-Trek)
Cadel Evans (ex-BMC)
David Millar (ex-Garmin)
El Diablo, também conhecido como Didi Senft, anunciou aposentadoria e não estará mais aguardando os ciclistas nas montanhas mais famosas do esporte.
Destaques por equipes
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BMC
O time trocou grandes medalhões por dez novos ciclistas, como o valente Alessandro De Marchi, Rohan Dennis (que venceu o Tour Down Under 2015) e Campbell Flakemore. Saíram Thor Hushovd, Stephen Cummings, Steve Morabito e a principal estrela, Cadel Evans, que se aposentou após o Tour Down Under e uma prova em sua homenagem, ambas em janeiro. O campeão olímpico de 2008, Samuel Sanchez, que seria dispensado, teve o contrato renovado em janeiro. |
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Astana
Trocou quase um terço do time e dispensou nomes conhecidos como Gasparotto, Brajkovic e Kessiakoff. Ao mesmo tempo, trouxe ciclistas experientes, como Dario Cataldo (ex-Sky), Rein Taaramae (ex-Cofidis), Lars Boom (ex-Belkin) e LL Sanchez (ex-Caja Rural) e a jovem promessa Diego Rosa, para trilhar os passos de Nibali e Aru. |
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Ag2r
O surpreendente time da Ag2r, de Bardet, Betancour e Peraud, vice-campeão do Tour 2014, não perdeu nenhum grande nome e ainda trouxe os polivalentes belgas Jan Bakelants e Johan Van Summeren. |
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Etixx-Quick Step
A equipe de Patrick Lefevere enxugou o elenco e dispensou nomes caros, como Alessandro Petacchi, Jan Bakelants, Wout Poels e Thomas De Gendt. Nada que deva impactar a base do time com mais vitórias de 2014: Cavendish é o nome para os sprints, Tom Boonen para as clássicas e Rigoberto Urán para as voltas. Com um detalhe: o campeão mundial Michael Kwiatkowsky deve assumir boa parte dos holofotes. |
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FDJ
Murilo Fischer será novamente nosso representante na elite do ciclismo, em uma equipe ainda mais definida em dois alicerces: Arnauld Demare para os sprints e Thibaut Pinot para as Grandes Voltas. As contratações de Kevin Reza (ex-Europcar) e Steve Morabito (ex-BMC) ajudam mais ao segundo do que ao primeiro, que contará com a manutenção de todos os principais embaladores no time. |
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IAM Cycling
O mais novo time no World Tour mantém a mesma base de 2014 e traz 11 novos nomes, como o colombiano Jarlinson Pantano e o veterano francês Jêrome Coppel. Os grandes destaques do time continuam sendo o australiano Heinrich Haussler e o francês Sylvain Chavanel. |
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Lampre
Será esquisito não ver o Damiano Cunego como um dos líderes da Lampre em 2015. Depois de 13 temporadas, o Pequeno Príncipe mudou-se para a ProContinental Vini Fantini-De Rosa. Também deixaram o time o veterano Chris Horner e o consistente colombiano Winner Anacona. As principais expectativas para a temporada recaem sobre o português Rui Costa. |
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Lotto-Soudal
A temporada 2014 não foi excelente para o time belga, porém eles não parecem dispostos a grandes mudanças. Andre Greipel continua o mais prolífico em vitórias, enquanto se espera algo mais de estrelas como Maxime Monfort, Jurgen Roelandts e Jurgen Van den Broeck. |
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Movistar
Uma das esquadras mais consistentes do World Tour, os espanhóis da Movistar têm dois líderes claros: Alejandro Valverde e Nairo Quintana. Satisfeito com os bons resultados nos dois últimos anos, o time mudou muito pouco e trouxe bons nomes, como o promissor Rubens Fernandez, o veterano Rory Sutherland e Winner Anacona. |
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Orica-GreenEdge
A equipe australiana continua com Michael Matthews e Simon Gerrans como principais nomes. Mais experimentes, os irmãos Simon e Adam Yates podem se afirmar. O time não fez nenhuma contratação de renome, mas dispensou Matthew Goss, que sempre teve mais pompa do que resultado desde que foi contratado, em 2012. |
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Cannondale-Garmin
A união entre duas equipes World Tour formou o time mais jovem do pelotão 2015. Além das bicicletas, a Cannondale trouxe, basicamente, seus nomes menos badalados. Dessa forma, as principais esperanças do novo time estão no quarteto remanescente da Garmin: Ryder Hesjedal, Daniel Martin, Andrew Talansky e Tom-Jelte Slagter. |
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Giant-Alpecin
De patrocinador novo e licença alemã, o time reforça o vínculo com suas principais estrelas: os velozes Michael Kittel e John Degenkolb. Enquanto o primeiro deve se manter soberano nos sprints, cresce a expectativa para a evolução de Degenkolb nas clássicas após o segundo lugar na Paris–Roubaix 2014. |
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Katusha
O português Tiago Machado e o campeão mundial sub-23 Sven Erik Bystrøm são as principais contratações do time russo, que continua centrando suas fichas no espanhol Joaquim Purito Rodriguez e no norueguês Alexander Kristoff. |
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LottoNL-Jumbo
A antiga Belkin (mais antiga ainda Rabobank) ganhou um novo patrocinador e novas cores para 2015. A indefinição sobre o futuro levou à saída de 13 ciclistas, entre eles os bons Bauke Mollema, Theo Bos e Lars Boom. O jovem Tom Van Asbroeck é a nova aposta para os sprints, Robert Gesink e Sep VanMarcke os homens de confiança e Wilco Kelderman deve ser o líder nas Grandes Voltas. |
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Sky
A temporada passada não foi ótima para a equipe de maior orçamento do pelotão, por isso o time foi ao mercado e trouxe reforços de renome — porém nada impressionantes. Nicolas Roche, Leopold Konig, Wout Poels e Elia Viviani estão sempre entre os primeiros, mas não são grandes campeões. Em contrapartida, deixam o time Edvald Boasson Hagen e o italiano Dario Cataldo, que marcou a presença da equipe nas fugas do Giro d’Italia e da Vuelta a España. |
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Tinkoff-Saxo
Estrela do mercado de transferências em 2015, a equipe de Oleg Tinkov e Bjarne Riis trouxe o eslovaco Peter Sagan, um ciclista promissor e extremamente importante sob o aspecto comercial. Com ele, vieram outros três nomes da equipe Cannondale, como o seu irmão Juraj e o veterano Ivan Basso, um gregário de luxo para Alberto Contador nas Grandes Voltas. O trio formado por Sagan, Contador e Rafa Majka é um dos mais interessantes para se observar este ano. |
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Trek
As aposentadorias de Andy Schleck e Jens Voigt colocam Fabian Cancellara ainda mais no centro dos holofotes da equipe Trek. Dois novos nomes, Marco Coledan e Gert Steegmans devem ajudar Giacomo Nizzolo nos sprints. Outra contratação importante é a de Bauke Mollema, que deve recolocar a Trek nas disputas por pódio nas Grandes Voltas. |
A matéria foi publicada originalmente na edição de abril da revista V02