Ano após ano, a São Silvestre recebe 30 mil participantes e outros milhares de curiosos que se aglomeram pela Avenida Paulista, coração de São Paulo, para acompanhar a corrida de rua mais tradicional do País. Mas pouquíssimas pessoas falam com tanta propriedade sobre o evento que fecha o calendário esportivo do país quanto Marilson Gomes dos Santos. Na verdade, nenhum outro brasileiro viveu tantas glórias na principal avenida paulistana quanto este brasiliense.
Marilson é o único brasileiro a levantar o troféu da São Silvestre em três oportunidades: 2003, 2005 e 2010, último ano em que o caneco ficou com um atleta da casa. Embora o Brasil ainda seja o país mais vitorioso da história da prova, com 29 vencedores na categoria masculina, há seis anos quenianos e etíopes se revezam no lugar mais alto do pódio.
A trajetória de sucesso de Marilson pelos trechos mais imponentes de São Paulo não seria a mesma se não fosse a insistência de Adauto Domingues, treinador com quem começou a trabalhar ainda na adolescência. Adauto dizia ao pupilo que a São Silvestre ajudaria a ganhar rodagem e experiência. Aos 19 anos, o corredor atendeu ao pedido do técnico e, logo em sua estreia, terminou entre os cem mais rápidos.
“Quando cheguei a São Paulo e comecei a treinar com o Adauto, ele já falava da São Silvestre. Queria que eu conhecesse percurso e, mesmo sabendo que eu não tinha chance de ganhar, sabia que aquilo ajudaria na minha ascensão”, diz.
A ascensão foi coroada em 2003, quando Marilson precisou de 43 minutos e 50 segundos para terminar os 15 km de percurso à frente de todos os outros concorrentes. “Quando você vence pela primeira vez é muito bom. Aquele momento em que você está no final da Brigadeiro [Luís Antônio, avenida de São Paulo], com o público gritando, torcendo, é inesquecível.”
Dois anos depois, já consolidado no cenário do atletismo, venceu a São Silvestre novamente e igualou o número de conquistas de um brasileiro que admirava na infância: o pernambucano José João da Silva, campeão em 1980 e 1985.
“Até hoje tenho uma admiração muito grande pelo José João. Nós temos quase o mesmo perfil. Ele era muito resistente, não era tão rápido no final. O José João foi um espelho para muitos atletas, inclusive para mim. Quando levei o tricampeonato, ele estava comentando a prova em uma rádio e me parabenizou por ter superado a marca dele. Foi muito humilde, como sempre, e ficou feliz por mim”, lembra.
Torcer para outros corredores brasileiros é o que Marilson faz desde 2016, ano em que deixou de disputar competições profissionais. A pedido da O2, ele elaborou uma pequena lista de dicas para os profissionais e amadores que pretendem chegar a um bom resultado na São Silvestre.
“A preparação é a base de tudo. Quem quer correr a São Silvestre, uma prova com um percurso duro, em uma época do ano muito quente, tem que se preparar bem para enfrentar os 15 km de prova. Gosto de lembrar das dicas básicas: não fugir da rotina, não comer nada que possa fazer mal na véspera e tomar o café da manhã de sempre.”
“Corra no pace que você está acostumado a fazer. Não adianta se empolgar com a pessoa que está do lado, que está na frente, principalmente no início da prova. É nesse ponto que as pessoas mais erram o ritmo e acabam pagando o preço depois. Sempre faça aquilo que já foi treinado anteriormente.”
“Na largada, o corredor está com a adrenalina a mil. Tem a tendência de largar forte e pode sentir depois. No início da prova, há muita descida, então a probabilidade de erro nesse trecho é bem maior.”
“O que parecia impossível acontece na São Silvestre.” Foi em tom de surpresa que Cléber Machado, narrador da TV Globo, descreveu a ultrapassagem de um paranaense de 24 anos sobre uma lenda do atletismo, o queniano Paul Tergat, já na reta final da edição de 1997.
Tergat, de 1,82 metro e pernas longas, costumava imprimir um ritmo alucinante na São Silvestre e, em 1997, já havia vencido as duas edições anteriores. Em 1995, estabeleceu um recorde que perdura até hoje: 43min12s. Sua vitória já era dada como certa por Cléber Machado, mas Émerson Iser Bem, herói improvável, atrapalhou os planos da lenda queniana graças à “adrenalina inexplicável” de ser o representante de uma multidão que se espalhava pela Avenida Brigadeiro Luís Antônio.
O gás adquirido na subida da Brigadeiro fez com que Iser Bem decidisse atacar Tergat ao entrar na reta da Avenida Paulista. O paranaense acelerou com todas as forças e viu o queniano seguir no mesmo ritmo, sem reagir ao ataque. Deu certo.
“No final da subida na Brigadeiro, o público, gritando e te incentivando, transmite uma adrenalina inexplicável. As pessoas assistem à prova nos bares ali da região e, quando a prova vai afunilando, todo mundo vai para a avenida. Só que as pessoas não sabiam o meu nome. É um nome difícil de falar, e eu só era conhecido dentro do atletismo, não entre o público geral. As pessoas não gritavam o meu nome, gritavam ‘Brasil’. É diferente ser o cara que representa toda a nação. Você mentaliza uma série de coisas. Aquilo foi muito intenso e decisivo para a minha vitória. Se fosse em outro país e sem essa atmosfera, eu não teria tido energia para terminar como terminei. O Paul Tergat tinha mais de 1 minuto de vantagem para o meu melhor tempo.”
Além de orientar Marilson, o treinador Adauto Domingues traçou a estratégia que levou Iser Bem ao ápice de sua carreira. O plano consistia em dividir a prova em três partes — que não precisam ser iguais.
“No terço inicial, o corredor deve sentir como está naquele dia. Pode estipular uma fase inicial para sentir a prova. Nessa fase, percebe se pode correr em um ritmo que, caso seja forte, não comprometa totalmente o desempenho do atleta. Se errou para menos, ainda dá tempo de recuperar também.”
“Depois, quando o corredor já sabe como está, vem o trecho intermediário. Se está mal, não há muito o que fazer. Se está bem, deve estar atento para não exagerar no ritmo e comprometer a reta final”, fala Émerson.
“Há uma coisa que o atleta profissional consegue fazer muito bem. É preciso ter muita experiência para terminar a prova em um ritmo tão forte a ponto de não sobrar energia. Passar pela linha de chegada com uma reserva de energia é um desperdício, mas eu também não posso esgotar a minha energia antes e me arrastar até o fim da prova. Essa dosagem é vital, mas requer muita experiência.”
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