A homofobia na escola e a monocultura do futebol no Brasil afastam uma parcela dos gays da prática esportiva logo na infância ou na adolescência. Como resposta ao velho jargão de que “futebol é coisa para macho”, o Unicorns surgiu em 2015 como a primeira equipe amadora com presença maciça de gays a se reunir semanalmente em São Paulo para praticar o esporte mais popular do país. No entanto, um entrevero entre alguns integrantes da pelada foi um dos pontos de partida para que o grupo seguisse os caminhos de uma modalidade em que a competitividade entre os praticantes não é tão acentuada: a corrida de rua.
Há cerca de três meses, o Unicorns, além dos jogos de futebol às quartas-feiras, passou a reunir nas noites de segunda, no Parque Ibirapuera, cerca de 15 pessoas que tinham interesse pela corrida e poderiam se comportar como bem entendessem. O grupo se estruturou, contratou uma treinadora e vem crescendo. Hoje, aproximadamente 30 corredores participam dos encontros semanais no parque paulistano.
“O homem hétero, quando joga bola com um gay, não entende muito a nossa pegada. Nós damos beijo, temos as nossas coisas ali. Eles [héteros] são muito competitivos e levam para o lado pessoal. Nós estávamos afastando alguns amigos que estavam jogando conosco por conta da postura de alguns. Na corrida, é diferente. Cada um corre por si. Não existe uma competitividade tão grande como no futebol. Ninguém precisa correr melhor que ninguém. Em todos os nossos treinos, alguém fala em trazer amigos para conhecer o grupo”, diz o publicitário Pedro Gariani, de 22 anos, um dos idealizadores do Unicorns.
Gariani conta que, após uma discussão durante uma partida de futebol, homens heterossexuais foram vetados das peladas do Unicorns, mas garante que nos treinos no Ibirapuera todos são bem recebidos. Quem vai aos encontros se depara com um ambiente semelhante ao de uma “crew”, porém com uma programação alinhada com a proposta de uma assessoria esportiva.
Uma treinadora organiza sessões de alongamento, promove treinos educativos, faz correções individuais e alterna longões com exercícios funcionais de alta intensidade. Para cobrir os custos da profissional e despesas relacionadas a material e hidratação, uma taxa de R$ 100 mensais é cobrada de cada um dos atletas.
“Sempre houve uma preocupação da nossa parte para que as pessoas pudessem evoluir no esporte. Eu sabia que a minha passada era errada. Queríamos alguém que nos ajudasse a melhorar”, afirma Gariani.
O publicitário assegura que o Unicorns, até agora, não recebeu olhares tortos no parque ou foi alvo de qualquer tipo de preconceito durante os treinos. Nem a utilização de leggings no lugar dos tradicionais shorts gerou comentários pejorativos.
“Eu não tinha colocado uma legging antes do grupo. Como começamos a correr em uma época de muito frio, comprei algumas leggings para correr. Nunca tive problema. Por estar muito frio, acho que as pessoas entendem o fato de nós corrermos de legging. No verão, pode ser diferente”, pondera.
Embora o projeto ainda seja embrionário, os idealizadores do Unicorns veem com bons olhos a ideia de, no futuro, organizar uma corrida pela diversidade sexual, nos mesmos moldes da que reuniu 2 mil pessoas nas ruas de Madri no fim de junho. A iniciativa, no entanto, é inviável sem o apoio de empresas.
“Se encontrássemos algum parceiro que entrasse nessa conosco, eu gostaria muito que o Unicorns idealizasse isso num futuro próximo. Por enquanto, ainda não tem nada concreto. Comecei a sondar empresas para nos patrocinarem, mas algumas delas ainda têm problemas com esse tipo de causa. Tentamos marcar uma reunião, uma apresentação, e essas empresas não tentam nem começar um diálogo. É provável que, conforme o grupo ganhe relevância e engaje mais pessoas, torne-se mais interessante para algumas marcas”, frisa Gariani.
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