“Nada é tão útil ao homem como a resolução de não ter pressa”. Em um esporte em que muitos lutam contra o relógio, a frase do poeta norte-americano Henry David Thoreau pode soar contraditória, mas aponta para um caminho seguro na hora de traçar objetivos na corrida. Não pular etapas e entender como ir dos 10 km para a primeira meia-maratona é uma forma de evitar lesões, frustração e o desinteresse pela modalidade.
Como os 10 e os 21 km são dois dos percursos mais populares nas provas, há quem desdenhe da transição entre as duas distâncias e se precipite na hora de fazer a inscrição para uma meia-maratona.
Combater essa impaciência dos alunos é um dos desafios diários do treinador Darlan Duarte, da assessoria esportiva Pacefit. Ele recomenda que, antes de dar esse salto, o corredor se estabilize nos 10 km, fortaleça sua musculatura, ganhe mais velocidade, melhore seus tempos, treine distâncias intermediárias entre os dois trechos para, aí sim, disputar a primeira meia-maratona.
“Com essa glamurização da meia-maratona e da maratona, parece que muitas pessoas começaram a correr ontem e já estão pensando em correr 21 km e 42 km. Não é por aí. O corredor precisa de lastro para fazer essa transição. A parte muscular precisa estar mais desenvolvida para dar esse salto”, recomenda.
Caso a transição seja precipitada, o corredor pode sentir os reflexos da impaciência em seu corpo. Duarte explica que as dores são “sinalizações de que o corpo não está se adaptando e não está absorvendo essa sobrecarga” provocada pelo maior trecho.
A consolidação em cada uma das etapas da corrida representa um conjunto de avanços na parte muscular, na mente e no condicionamento físico. Sem esse progresso coletivo, aumentam os riscos de algo dar errado na meia-maratona, como não terminar a prova ou finalizá-la andando.
“O chato da história”
Quando vê o aluno se precipitando na hora de se inscrever para a primeira meia-maratona, não é responsabilidade do treinador alertá-lo que ainda é cedo para disputar uma prova daquele porte? É aí que surge um dilema comum na vida de quem trabalha nas assessorias esportivas.
Júlio Dotti, da assessoria Limite, já perdeu alguns alunos por tentar frear a empolgação em situações como essa. Ele cobra mais sinceridade e responsabilidade dos colegas na hora de estimular e informar os assessorados.
“Os alunos têm muita empolgação. Hoje, por exemplo, todo mundo quer fazer a Meia da Asics. O que eu vejo na área dos treinadores é que, muitas vezes, mais vale o que você está ganhando do que o que está passando. Eu sou o chato da história. Sempre falo para os alunos: ‘É isso que você quer?’. Tem que balancear tudo isso. O aluno pode ter capacidade [para correr uma meia], mas talvez não naquele momento, antes de cumprir algumas etapas.”
A importância de respeitar o estágio de cada um
Na corrida, como em qualquer outro ambiente na vida, é preciso discernimento para saber que nem sempre é possível embarcar nos mesmos objetivos de quem te cerca.
“Não é porque você entrou em uma equipe que já está pronto para correr distâncias maiores. É constante ver alunos acostumados a percursos mais longos dizendo ‘se for para correr 10 km, eu nem saio de casa’. Isso acaba atingindo quem começou a correr há pouco tempo. Cada pessoa está em um momento de vida, em um estágio na corrida”, fala.
Quando partir para a primeira meia-maratona?
Para não fazer a meia-maratona aos trancos e barrancos, o corredor deve, segundo Dotti, treinar de forma contínua por pelo menos três meses, três vezes por semana, com sessões de, no mínimo, uma hora e, no fim de semana, completar um treinamento de aproximadamente 90 minutos.
Não sofrer com lesões nesse período é essencial para concretizar o passo seguinte. Ele diz que correr 15 km nos treinos é um bom indício de que a meia-maratona é uma meta palpável. “Se a pessoa estiver correndo os 15 km, os 21 km estão próximos”, ressalta.
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