Vamos imaginar que uma pessoa tem por objetivo correr uma maratona ou um Ironman. Belo desafio, hein?! Normalmente o treinador faz uma entrevista prévia com essa pessoa, e em seguida algumas avaliações para obter dados e informações que o permitam elaborar um programa de treinamento individualizado.
É quando o coach pede aquele check-up médico geral, antes mesmo do início dos treinos, que faremos uma pausa na narrativa para uma breve “historinha”.
Um belo dia, uma pessoa me telefona e pede informações sobre treinamento para corredores amadores que têm o objetivo de completar uma maratona. Percebendo o grande interesse e o furor desse futuro “cliente” em começar a correr, eu explico as linhas gerais do nosso trabalho, solicito que ele faça um check-up geral em um cardiologista, e que me traga os resultados no dia da nossa entrevista inicial ou no primeiro dia de treino.
Essa pessoa nunca mais apareceu, nem ligou, sequer deu sinal de vida. Tentei contato, mas sem sucesso. Após alguns meses, um treinador que trabalhava conosco vai a um jantar, conversa vai conversa vem, é abordado por um rapaz que lhe diz: “por causa do coach Rogério eu não pude iniciar o treinamento para maratona!”
“A questão é que ele me pediu que fizesse um check-up médico e desde então fui diagnosticado com um quadro preocupante de hipertensão. Estou em tratamento e terei que esperar cerca de seis meses até saber se estarei liberado.”
Imaginemos se a conduta inicial não tivesse sido essa. Mesmo parecendo pessimista, porém realista, essa pessoa poderia ter entrado para estatística de mais um atleta ou praticante de atividade física que vem a óbito devido a um “mal súbito”.
A grande questão então é quando e por que devemos realizar check-ups, testes e avaliações ao praticarmos um esporte. Parece meio óbvio, todo mundo sabe, todo mundo fala, todo mundo ouve que é importante. Contudo, muitos atletas, principalmente amadores, negligenciam ou se tornam indiferentes acerca do assunto, e saem por aí treinando, treinando e treinando.
Será que realmente sabem o risco que estão correndo? O mais correto, independentemente do condicionamento físico ou da experiência do atleta, é realizar exames e check-ups anuais, preferencialmente solicitados e avaliados por um cardiologista.
Eles devem fornecer um panorama de como está a saúde, se existe algum indício de doenças cardiovasculares “silenciosas”, ou se o atleta apresenta algum outro quadro adverso que o impossibilite de treinar ou até mesmo de competir.
Via de regra, testes ergométricos, eletrocardiogramas, ecocardiogramas e hemogramas completos já permitem validar (ou não) se a pessoa está apta e gozando de plena saúde para treinar.
Mas acredite se quiser, não é a maioria dos atletas que faz e renova anualmente esses exames e check-ups. O coach tem que fazer trabalho de “formiguinha”, educando sobre a importância, e sendo bem sutil e delicado ao solicitar esses exames.
Às vezes, por conta da insistência e das diversas argumentações, acaba até perdendo o atleta. Mas antes assim do que colocar uma vida em risco.
Mas e os testes? Bom, depois que o atleta recebe o aval de que a saúde está “em cima”, os testes se fazem necessários para a individualização do treinamento, quantificação das cargas, e monitoramento/avaliação do desempenho ao longo do período.
Clínicas especializadas, centros de excelência esportiva e alguns laboratórios oferecem testes que chamamos de “gold standard”. Utilizando tecnologia de ponta e protocolos de avaliação específicos por modalidade esportiva, tais testes fornecem dados precisos relacionados às variáveis fisiológicas preditoras do desempenho.
Dentre os mais aplicados e conhecidos temos o teste ergoespirométrico de esforço máximo para corredores e para ciclistas, teste de economia de corrida e de eficiência (no caso do ciclismo), e teste de lactacidemia em esteira e em cicloergômetro.
Caso o atleta não tenha acesso a esses testes, é possível realizar outros, porém de campo, que também fornecem dados importantes para a prescrição do treinamento e para a avaliação do desempenho.
Temos, por exemplo, o teste de 4000m de corrida através do qual se obtém a velocidade de limiar anaeróbio, o teste de velocidade crítica na natação, o tão famoso e em voga FTP no ciclismo, e vários outros. Vai do coach saber o que quer avaliar e qual teste lhe fornece os dados necessários para tal.
Além disso, é possível aplicar testes de desempenho mais simples, baseados em metragens, por exemplo, e em diferentes épocas do ano. Os 5km contrarrelógio para um corredor, 20km contrarrelógio para um ciclista, 1000m para tempo no caso de um nadador, periodicamente realizados e sempre num mesmo percurso ou local, empiricamente demonstram se atleta está melhorando o desempenho frente o programa de treinamento.
Contudo, independentemente dos testes serem de laboratório ou de campo, para que um atleta apresente melhoras significativas, é preciso passar por um período consistente de treinos que varia de 6 a 8 semanas.
Agora, voltando um pouco. Imagine aplicar esses testes máximos e de desempenho num atleta, sem antes ele ter realizado um check-up médico. Você garante que o “maquinário” dele está 100% apto para aguentar todo esse estresse fisiológico?
O pior é que se perguntar isso para o próprio atleta, alguns irão bater no peito e dizer: “opa! Fica tranquilo, coach! Tenho vida saudável, nunca fico doente, faço check-up pela firma todo ano, só não fiz no ano passado. Mas esse ano já está programado para eu fazer nas minhas férias, sem falta.”
E é por isso e muito mais que atletas e treinadores devem ter consciência de que o check-up médico, repetido anualmente, é imprescindível para que ambos tenham segurança e tranquilidade para desenvolverem um bom trabalho que ofereça condições do atleta se desenvolver e atingir seus objetivos sem sofrer consequências negativas à saúde.
Bons treinos e até a próxima!
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