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Com um pouco de atraso, admito, relembro aqui, mais uma vez, do meu querido amigo Ayrton Senna, já que no mês de maio recordamos o seu trágico acidente que ocorreu há 20 anos. Foi por meio de suas infindáveis corridas na pista de atletismo que ele formou o seu caráter e desenvolveu a sua personalidade. Com sua dedicação e persistência durante os treinos na pista do Cepeusp (Centro de treinamento da USP) é que ele foi, aos poucos, se transformando.
Mas não foi apenas um bom físico que ele conseguiu conquistar naquele circuito de mil metros. Ao ultrapassar as barreiras naturais de seu corpo, ele foi construindo uma mente perseverante, decidida e consciente das vitórias alcançadas. A corrida, caro leitor, deu a Senna não só confiança, como também um poder de autocontrole emocional que foi fundamental para a sua carreira.
Nosso campeão ficou deslumbrado com o seu estarrecedor progresso físico, uma vez que era considerado, antes da corrida, um rapaz fraco, magro e franzino. E eu sempre dizia a ele: a pessoa que consegue transformar ela mesma tem o poder de transformar o mundo. Não é a vitória sobre o outro que deixa alguém poderoso, mas a vitória sobre si mesmo. E foi isso que ele conquistou por meio da corrida.
Muitas vezes eu pedia para ele dar 40 voltas na pista de 400 metros, a 1min30s cada, o que exige um tremendo esforço físico. Como se não bastasse esse terrível desafio de superação, eu exigia ainda mais. Quando ele estava para cruzar a última linha de chegada e terminar o treino, já física e mentalmente exausto, eu gritava: “Quero agora mais três voltas. Vamos lá, Ayrtão, você consegue”. Ele ficava bufando de raiva e quase me xingando, mas obedecia à ordem e conseguia quase o impossível, dava mais três voltas.
Só quem compete em alto nível sabe o que representa alguns metros a mais daquilo que você havia estipulado como ponto final. E era nesse momento que eu conseguia treinar o seu espírito de bravura e sua capacidade de resistir e superar o insuperável. Ao vencer esses obstáculos, ele adquiria a capacidade de vencer adversidades e frustrações.
Era interessante ver como um rapaz que detestava correr (sem o carro, claro!) passou a gostar tanto do esporte. Isso prova que a corrida pode conquistar qualquer um se o professor souber administrar adequadamente o esforço de acordo com as condições de seus alunos. Para isso, é preciso não fazer dela um sacrifício prolongado de extremo sofrimento e mau gosto.
Ayrton gostava tanto de correr que fazia isso em todos os locais possíveis e inimagináveis: na grama, no asfalto, no concreto, onde pudesse. Ele adorava também correr em praias paradisíacas, onde muitas vezes o homem ainda não havia tocado suas areias. A corrida era tão incrível para ele que não se pode representar o Ayrton sem um belo calção e um bom tênis nos pés.
(Coluna publicada na Revista O2, edição #134 – junho de 2014)
*Por Nuno Cobra
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