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Pensei, pensei, pensei para fazer o título deste texto. Nós, jornalistas, lutamos sempre pela clareza e precisão, buscamos empregar palavras inteligíveis por todos –ou pela maioria— dos leitores. E “tilt”, sei lá, talvez não seja o mais conhecido verbete do mundo.
Nem sei se existe. Era a palavra que a gente usava, lá nos idos de 1990 e caquerada, quando jogava fliperama (ih, outra palavra que talvez seja desconhecida de boa parte de meu jovem leitorado…).
De vez em quando, sabe-se lá por quê, a máquina travava, não aceitava mais comandos, não mexia mais os flippers (espécie de aba móvel, usada para bater em bolinhas –daí o nome da máquina e, por extensão, do jogo, fliperama). Em suma, ficava paradona, travada.“Deu tilt!”, era o que dizíamos então, os que jogávamos fliperama.
Pois deu tilt na maratona internacional de Porto Alegre, que considero a melhor corrida do gênero no país. Foi lá que fiz meu debute nos 42.195 metros, foi lá que festejei meus dez anos de maratona (que já vão longe).
Baseado na minha experiência, é a maratona brasileira que melhor atende (talvez seja a única a atender) os requisitos básicos, essenciais para se tenha um boa prova.
Tem largada cedo e é realizada num período do ano em que, geralmente, o clima é frio, muito bom para correr –pelo menos para o meu gosto.
E a organização, pelo menos nas edições em que eu participei, nunca atrapalhou. Não gosto das constantes trocas de percurso, mas isso é da vida.
Pois bueno, para encurtar a história, a melhor maratona do Brasil passou muito mal em sua 33ª edição, realizada justo no Dia dos Namorados, num frio de renguear cusco, como se diz lá no Rio Grande (para quem não entende gauchês, traduzo: frio de deixar cachorro manco).
O problema que todo mundo viu estava exposto no pórtico: a cronometragem falhou. Por conta disso, não houve entrega dos prêmios no horário previsto –troféus de faixa etária ficaram de ser enviados para os ganhadores.
Com razão, os participantes ficaram insatisfeitos, indignados mesmo em maior ou menor grau.
“A falha na cronometragem, com total certeza, foi o problema mais grave. O momento do pódio é sagrado e único. Isso foi perdido e não voltará mais, independente que troféu enviado posteriormente seja o mais belo do mundo, isso foi irreparável”, escreveu em sua página em uma rede social o treinador Cleimar Rodrigo Tomazelli.
Com um cartel de mais de 40 maratonas e provas mais longas, Cleimar é diretor técnico e fundador da Cia dos Cavalos, equipe de Mateus Soares Trindade, campeão da maratona de Porto Alegre no ano passado e vice-campeão neste ano.
Na opinião dele, “a organização teria que fazer o controle manual na chegada dos 21 km e 42 km, como prevenção de qualquer falha no sistema. Uma prova desse porte, obrigatoriamente, tem que contratar staffs suficientes para ficarem responsáveis por essa parte. Poderiam até atrasar a premiação, mas os atletas não perderiam esse momento tão especial”.
Para os atletas que buscam resultado e também esperam ganhar prêmio em dinheiro por seu esforço, a prova deste ano foi uma decepção. Ao contrário do que aconteceu em edições anteriores, a maratona de Porto Alegre não pagou prêmios em dinheiro para os vencedores na faixa etária.
Não haveria problema, desde que os participantes tivessem sido avisados. O regulamento, porém, dizia que a recompensa para os ganhadores nas categorias seria troféu e premiação a definir.
Sobre isso, Cliemar comenta: “O último desrespeito, que na realidade foi o primeiro, abrir as inscrições da prova sem ter definido o valor das premiações. Isso é indesculpável, pois ficou nítido que foi para ludibriar a galera. Eu mais ou menos imaginava que a premiação da geral seria a mesma vergonha de 2015. Mas ninguém poderia imaginar que a premiação das categorias tivesse simplesmente sido extinta. Por que não anunciaram logo de cara? Por que somente 15 dias antes da prova anunciaram que não teríamos mais essas premiações? Foi propositalmente para esperar que todos os atletas de fora de Poa se inscrevessem? Que vergonha!”
Eu não quero acreditar que os organizadores quisessem enganar os corredores. Boas intenções, porém, não resolvem. O fato é que não houve a premiação, e que nem todos foram avisados de que não havia pagamento em dinheiro.
“Se eu soubesse, nem largaria”, me disse o campeão da maratona de Porto Alegre na categoria I (60-64).
“Iria para Porto Alegre, pois já estava com tudo pago, mas não participaria da prova. Vou correr para não ganhar nada? De jeito nenhum”, afirmou Bartolomeu da Silva, que completou a prova em 2h51min02s.
Ele se sentiu traído, sim. Poucos conseguem imaginar o esforço que é se preparar para vencer uma maratona –como faz Bartô, com quem tenho a honra de treinar na Força Dinâmica.
Aposentado, ele não vive dos prêmios, mas a recompensa ajuda a equilibrar as finanças. “Se soubesse, iria correr outra prova”, afirma, adiantando que, no ano que vem, não volta a Porto Alegre se não houver premiação definida e confirmada.
Ao mesmo tempo, ressalta que a prova foi boa.
Aliás, um corredor quarentão que encontrei na fisioterapia fez sua estreia em maratonas nessa edição. Voltou totalmente feliz, entusiasmado, garantindo que, no ano que vem, estará lá mais uma vez.
Tomara que todos que largarem na edição número 34 da maratona de Porto Alegre tenham uma prova perfeita, sem bagunças, sem bate-cabeça de organizadores, sem relógio quebra. Sem tilt.
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