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Os incontáveis ‘se’ e a busca eterna pelo desprazer

Há tempos quero escrever sobre este tema. Confesso que por vezes deixei de lado por achar que era exagero da minha parte ou até mesmo pesado demais. Porém, acho que estamos numa onda tão caótica em todos os sentidos que, no esporte, as coisas infelizmente também têm caminhado para o mesmo lado e garanto: está chato demais! Ok, vou explicar.

Conforme vamos vivenciando nossos esportes, ganhamos cada vez mais amigos e conhecidos do “meio”. Com este número de contatos crescendo, é natural que todo domingo a timeline do seu Facebook tenha incontáveis fotos de competições, treinos malucos, linhas de chegada, pódios e etc., certo?

Além disso, basta chegar no seu ponto de treinamento na segunda ou terça-feira que obviamente o assunto será o que rolou no fim de semana ou contigo ou com seus amigos, concordam? Até então, tudo ok. No entanto, tenho observado bastante a forma com que as pessoas falam de seus resultados e também dos resultados dos outros – o que passa a ser um pouco mais grave, no meu ponto de vista.

Salvo raras exceções, não tenho visto mais prazer algum das pessoas em praticar seus esportes. Confesso que em vários momentos eu também caio nessa “vibe” e só percebo que estou nela quando as conversas realmente pesam.

 

 

Também uso muito a oportunidade única que tive de viver no meio competitivo da natação por alguns anos, ainda na adolescência. Naquela época, a busca pela perfeição nos 20 e poucos segundos de uma prova era tão intensa que não havia tempo nem mesmo para pensar. Vou dar alguns exemplos e peço gentilmente que reflitam se isso tem feito parte da vida de vocês ou de seus amigos:

1. Como foi a prova? Ah… Faltou isso ou aquilo, a bike não sei o que, o joelho pegou, o mar estava mexido, o sol estava muito quente, mas tirando isso foi ok;

2. Como foi a maratona? Ah… eu queria fazer sub-2h50min, mas deu 2h55min. Também, a prova tinha 42,6 km, eu fui preparado para chuva mas abriu um baita sol, não consegui largar lá na frente e foi chato demais ter que passar aquele povo todo;

3. Como foi o treino? Ah… eu queria correr para 4min/km… saiu 4min02s, mas tinha uma subidinha no km 12, o relógio parou de funcionar no km 8 e o bebedouro estava sem água, então sei lá;

Além desses exemplos, tem outros pontos como:

1. “Nossa, meu treinador deve estar com problemas. Mandou uma planilha absurda!”;

2. “Meu Deus, essa planilha está acabando comigo!”;

3. “Se tivesse mais 500m eu pegava o cara”;

4. “Se não tivesse aquela subida, eu batia meu recorde”;

5. “Depois da prova vou comer um chocotone sozinho”;

6. Chegar para treinar às 6h e ouvir de atletas: “Afff… estou destruído”;

7. Sair para almoçar e ouvir de atletas: “não aguento mais comer só mato”;

8. Depois da prova: “não quero ver essa bike na frente por um bom tempo!”;

Conseguiram refletir? Enfim, esses são apenas alguns dos inúmeros comentários que ouvimos todos os finais e inícios de semana, concordam? Agora vamos às conclusões:

a. É fundamental lembrar que você faz isso porque você quer. Você não é obrigado a cair da cama às 5h, calçar seu tênis e correr, nem gastar rios de dinheiro com equipamentos e inscrições, tampouco cruzar a linha de chegada de um Ironman.

b. Cada prova é uma prova! Mesmo que seja no mesmo local, a água do mar, nuvens, posição do sol, vento e etc. não ficarão lá parados por 365 dias esperando a próxima edição.

c. Não, seu treinador não é louco. Posso crer que ele sabe o que está fazendo. Além disso, você o paga e, se não está satisfeito, você pode procurar outro. Como ouvi certa vez de um treinador: o mais importante é refletir se você não está colocando como objetivo cruzar o oceano a nado, sem saber amarrar os óculos… quiçá nadar;

d. A alimentação equilibrada faz parte do contexto da saúde e não da competição A ou B. É natural nos privarmos de algo e até tratarmos tais “escorregadas” como premiação por uma meta, mas daí a usar isso como mais uma punição é realmente necessário?

e. Por fim, se algo não saiu como imaginávamos, valem duas perguntas simples: você deu o seu melhor? Viveu ali absolutamente tudo o que poderia viver? Se sim, eu garanto: você não tem motivo algum para reclamar e, sim, de vibrar muito!

Minha conclusão é que, de uma forma geral, os treinos, as competições e os resultados têm sido mais um peso na vida das pessoas do que qualquer outra coisa. Está cada vez mais difícil ver comentários positivos. Sempre tem algo que não permitiu ir além, superar marcas e etc…

Será mesmo que precisamos fazer de cada série de treinos mais uma carga chata e pesada dos nossos dias? Será que fugir da sua meta é culpa do relógio, da subida ou do mar mexido? Infelizmente, os benefícios incríveis que o esporte proporciona têm sido esquecidos. Triste demais!

As dicas que tenho trabalhado comigo e gostaria de compartilhar são: coloque na planilha de treinos 10 minutos diários de reflexão sobre o que te motiva estar ali; outros 10 minutos para simplesmente agradecer por poder fazer tudo isso; e, por fim, busque enxergar o lado bom de tudo. O mundo está cansado de tanta negatividade. Não faça isso consigo mesmo.

Um forte abraço e até a próxima.

A.B.

Arthur Borelli

Empresário e atleta amador, Borelli direcionou sua vida profissional e pessoal para o esporte e garante que foi a melhor escolha que fez na vida. Atualmente, transita entre maratonas, corridas de montanha e triathlon. Movido por desafios, busca provas cada vez mais singulares, longas e em lugares diferentes. Tudo isso para conectar seus dois grandes prazeres: competir e viajar!

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