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Mountain bike: De amadora para atleta profissional

Uau! Com tanta coisa para contar, por onde começo este texto? Faz tempo que não escrevo. Os últimos meses foram focados nos treinos de mountain bike e no trabalho para poder sair (merecidamente) de férias.

Não sei se começo falando do Brasileiro de Maratona, na qual conquistei o título de Campeã Brasileira — depois de uma dura disputa com a segunda colocada. Ou se conto, primeiro, da Leadville Trail 100 MTB, prova de 100 milhas no Colorado (EUA), a duas semanas, onde conquistei um incrível 5º lugar entre atletas olímpicas, campeã e vice-campeã Mundial. Ou será que faço logo um resumo de 2015, ano especial, de colheita de frutos no âmbito pessoal, profissional e também na carreira esportiva? Bem, vou contar um pouco de tudo, pois não cheguei aqui do nada.

Começo respondendo à pergunta que vários me fizeram após a vitória no Brasileiro de Maratona: Como você se preparou para conquistar esse título (Campeã Brasileira de MTB XCM)?

Bom, eu tenho duas verdades opostas para responder a essa pergunta. A primeira é que eu venho me preparando para esse momento desde o dia em que fiz meu primeiro treino de mountain bike, em fevereiro de 2011, na região de Morungaba (SP), quando comecei a fazer provas de aventura com a equipe Lebreiros. Todos tinham que esperar por mim, eu mal parava em cima da bike, levava muito mais comida do que precisava, não sabia trocar marchas e por aí vai. Mas eu olhava os mais experientes com admiração e respeito. Eu queria chegar lá! Ou melhor, eu queria ir além… descobrir os limites ou superá-los. Bem, ainda quero.

A segunda é que, na verdade, eu não me preparei especificamente para essa prova. Quando me dei conta de que estava bem o suficiente para encarar minha profissionalização no esporte — e isso aconteceu no Brasil Ride Warm Up, em Botucatu (SP), em junho deste ano — e enfrentar um campeonato Brasileiro, adaptei meu calendário e encaixei a ida para Picos (PI), local do Brasileiro de XCM.

Mas mesmo com essa alteração, meu foco se manteria em Leadville Trail 100 MTB, prova de 100 milhas no Colorado – EUA, com a qual venho sonhando desde minha época de corredora e que aconteceria a exatos 15 dias do Brasileiro.
Agora, rumo ao Brasileiro de maratona!

Sobre o Campeonato Brasileiro de MTB Marathon 2015

Só quando passou Leadville que conseguimos planejar a ida para Picos, no Piauí, para o Brasileiro de Maratona. O primeiro passo era não sair da altitude, pois ao baixar para o mais próximo do nível do mar, em um primeiro momento viria uma sensação boa, de alta performance. Mas, em um segundo momento, estaria sujeita a uma “baixa”, cansaço e perda de performance. Para postergar essa “baixa”, ficamos o máximo possível a 3.000 metros de altitude e voltamos para o Brasil a 4 dias de viajar para o Piauí. O lado ruim é obvio: cansaço e correria.

No domingo (dia 24 de agosto), iniciamos a volta para casa. Mas só consegui mesmo chegar em casa na madrugada de segunda para terça-feira. Entre terça e quinta, precisei lidar com o jetlag da viagem, arrumar a casa, lavar roupa, fazer outra mala, rever familiares e, sinceramente, não sobrou tempo para treinar.

Na sexta-feira (28 de agosto), às 3h da manhã, iniciamos a ida de São Paulo até Picos, no Piauí. Chegamos ao hotel às 12h30. Exaustão!!!
Sábado fiz meu primeiro treino em oito dias. Foi bom. Fizemos o reconhecimento da primeira serra da prova. Pernas pesadas, mas me sentindo bem. É bom puxar o ar e sentir que ele te “abastece” de oxigênio (diferente da sensação em altitude).

O plano para a os 96 km do campeonato Brasileiro de MTB Marathon era dar o meu melhor, e ver o que seria. O calor de 40ºC e a areia seriam os maiores adversários. Bom para mim, pois tenho uma boa experiência com esse “combo” pelas duas Brasil Rides que tenho na bagagem. Caprichei no protetor solar (sempre coloco uma camada de protetor com base embaixo do filtro de alto FPS no rosto), e, sabendo dos trechos de empurra bike nos areões, também besuntei meus pés de Bepantol.

Estava sem apoio e optei por utilizar isso ao meu favor — estou acostumada a andar autossuficiente. Meu pensamento: “vou levar tudo o que preciso, e assim não precisarei parar em momento algum. Será ruim subir a serra com tanto peso, mas a maior serra é bem no começo da prova, pode dar tempo de recuperar nos planos e descidas.”

Na largada percebi que minhas principais adversárias estavam com estratégia oposta (sem camel back, apenas caramanhola na bike) e pensei “ou meu plano vai dar muito certo e eu terei vantagem, ou será o contrário”.

Largamos um minuto atrás da elite masculina e a prova começou mesmo depois do deslocamento de 5 km até a estrada de terra. Em um primeiro momento, me posicionei atrás das principais atletas do pelotão, Tânia Pickler (campeã Brasileira 2014) e Ana Panini. Mas, ao perceber o movimento do pelotão da Sub23 que largou logo atrás, me encaixei e aproveitei o embalo. Depois de um tempo, vi que a Tânia me seguiu e andamos juntas até o início da serra.

Sabendo que subidas são o ponto forte dela, abri para que colocasse seu ritmo e tentei acompanhar o quanto pude. Me senti pesada, fazendo mais esforço do que poderia e tive que diminuir o passo. Aos poucos, ela desapareceu da minha frente, parecia que tinha uma âncora me segurando. Tudo bem. Vamos em frente: “Vivi, concentra na sua prova, faça seu ritmo. ”

Depois da serra, um singletrack gostoso e fluido até o primeiro trecho de estradão plano. Assim que entrei na estrada, percebi a Tânia a uns 300 metros. Percebi que meu passo no plano era bom e que poderia alcança-la.

Quietinha cheguei e tentei abrir vantagem. Ela reagiu. Vamos revezar? Ela topou. Fomos em dupla até a segunda serra (e, novamente, me vejo disputando posição com alguém que admiro e que preferiria de fato formar uma dupla do que disputar uma posição). Na subida, o previsível: lá se foi ela, num giro lindo, voando serra acima. Me contentei com meu ritmo. Dessa vez, tentei apenas não perdê-la de vista.

Ao fim da segunda serra, novamente a busca para fechar o gap. Consegui e, logo antes da entrada de um singletrack, dei tudo o que tinha para tentar alguma vantagem. E desse momento até a linha de chegada, foi uma fuga dolorida tentando manter a posição conquistada. Passei batida em todos os apoios, aproveitei o máximo da posição aerodinâmica em cima da minha S-Works Era e dei tudo o que tinha nas subidas. Olhei para trás a cada minuto, e, mesmo na reta final, mal podia acreditar que tinha conseguido manter-me na frente.

Durante os 50 km da prova, para manter minha motivação, pensava em como eu gostaria de cruzar a linha de chegada. Se seria com os braços levantados. Se daria um grito. Se caminharia com a bike levantada. Mas, na hora que isso realmente aconteceu, não consegui segurar o choro. A emoção tomou conta e eu estava completamente anestesiada.

O abraço apertado do namorado coroou o fim de um grande dia encima da bike.

E agora? Brasil Ride!!!

Ainda com os sentimentos a flor da pele (gratidão!!!), preciso me organizar após esse mês de férias, apresentar meu lindo troféu de campeã brasileira para os colegas do trabalho e me recuperar de todo o cansaço.

Tenho seis semanas até a Brasil Ride e não consigo segurar o sorriso no rosto, toda vez que penso que fiz minha parceira orgulhosa. Eu e a Raiza poderemos usar o uniforme igual, de campeãs brasileiras. Mal posso esperar para alinhar na largada do prólogo ao lado da minha amiga e não medir esforços para ajudá-la a conquistar pontos preciosos para representar o Brasil nas Olimpíadas do Rio 2016!

Viviane Favery

Campeã brasileira de mountain bike marathon (2015), é atleta da equipe alemã Rose Vaujany fueled by ultraSPORTS e já representou a seleção nacional em alguns campeonatos mundiais. Fora das trilhas, corre para conciliar a vida de ciclista profissional com a de publicitária e marketeira, além de compartilhar suas dicas de pedal em um boletim semanal na Rádio Jovem Pan Online FM, batizado de Bike by Vivi Favery.

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