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Já é comum que corredores cheguem em nosso consultório tendo em mãos uma avaliação biomecânica da corrida. O problema é que muitos deles não sabem exatamente o que fazer com ela. Avaliar é só o primeiro passo. A partir daí temos que saber o que fazer com a informação.
Muita vezes os atletas recebem uma cartilha do tipo “empurra mais o chão para trás”, “pratique o autocrescimento” e “aumente a cadência”, mas como fazer isso continua um mistério. Até porque alguns ajustes que possibilitam isso são sutis e dependem de uma orientação mais direcionada, ou mesmo de manobras de liberação específicas.
O conhecimento na área da biomecânica está difundido de forma surpreendente. Hoje muitos repórteres especialistas em corrida sabem às vezes mais sobre biomecânica do que muitos profissionais da área da saúde.
Mas o que é essa tal de biomecânica? Como este conhecimento pode ajudar um corredor profissional ou amador?
Na verdade, a biomecânica é o estudo das forças da física mecânica que atuam sobre o corpo humano. Hoje o estudo da anatomia já não traz mais grandes novidades, assim sendo, o que nos traz grande curiosidade é como esta anatomia e nossa fisiologia musculoesquelética lidam com as forças que vêm do meio externo e interno também.
Mesmo quando parado, nosso corpo está interagindo com essas forças, como a gravidade e reação do solo, e quando em movimento acrescentamos basicamente o impacto (que é uma potencialização da reação do solo pela aceleração) gerado pelo contato com o solo e o atrito com o solo e com o ar.
Pequenas variações, como a oscilação do corpo para frente ou para trás, podem gerar uma mudança importante na relação entre as articulações aumentando ou diminuindo estas forças que agem sobre o nosso corpo.
Esta variação do centro de gravidade, ou seja, de onde incide a resultante da força de gravidade no nosso corpo é parte da análise biomecânica.
O posicionamento dos braços e pernas também é analisado. No plano frontal, podemos visualizar melhor as rotações, e no lateral, as flexões e extensões. Rotações, flexões e extensões excessivas podem ser geradoras importantes de gasto energético desnecessário, acarretando em instabilidades ou até mesmo em rigidez.
Um exemplo é a rigidez do tronco, como consequência de quando o corpo não consegue lidar com a instabilidade. O problema é que sempre que temos uma articulação rígida, temos uma outra articulação próxima a ela que está sobrecarregada para lidar com aquelas forças.
Além disso, temos questões mais sutis que devem ser analisadas em testes biomecânicos e posturais que fornecem informações importantes, que em alguns casos podem nortear melhor liberações específicas, tanto no sistema musculoesquelético, miofascial e de mobilizações articulares.
Isso pode ser especialmente importante em sistemas mais sensíveis, como o orgânico-visceral (abdômen e tórax), e no crânio, onde estão os principais sistemas que trazem a informação para o cérebro de nosso posicionamento no espaço (vestibular, estomatognático – sistema mastigatório- e visual, principalmente).
Basicamente, temos que pensar que acumulamos tensões em forma de fibroses retracionais por todo o corpo por situações de estresse que passamos, cicatrizes, má postura ou posturas prolongadas, alimentos que causem algum tipo de intolerância e acúmulo de gases, e, sem dúvida, alterações biomecânicas na marcha, corrida ou caminhada.
Portanto, para que a análise seja completa, após a avaliação biomecânica da corrida é importante que o corredor passe por um profissional que não só entenda de corrida, mas também seja capaz de relacionar as informações colhidas no laudo com uma avaliação postural dinâmica em consultório, e que poderá conectar as duas avaliações para determinar se existe alguma relação entre alteração biomecânica e dor ou lesão, ou perda de performance.
Parte desta análise vem de uma conjunção de conhecimentos que passam pelo estudo das cadeias musculares e da forma como elas interagem com os outros sistemas do corpo, e de visão embasada de como nosso sistema neuropsicomotor se desenvolve desde a infância e como mantemos estes sistemas funcionando na idade adulta, em como interagimos com o ambiente que está a nossa volta e a qualidade de nossa movimentação.
A partir daí fica mais fácil planejar uma estratégia para resolver a questão primária, seja ela uma mau hábito ou uma retração ou erro biomecânico, e ter um ganho real em termos de qualidade de corrida, entendendo que algumas questões estão arraigadas há muitos anos, necessitando assim um esforço de médio a longo prazo para termos uma resolução.
Afinal, correr com dor não é normal!
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