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Quer pedalar com segurança? Vá de saia

Teve um dia que eu desci a rua Bartira, cruzei a avenida Sumaré (em São Paulo) e entrei no posto que tem ali na esquina para encher o pneu da minha bicicleta. Tô lá tentando encaixar a mangueira de ar no bico da câmara, quando ouço o som da porta de um carro se abrir e uma voz vindo na minha direção:

– Meniiina, como você é boa nisso. Eu vi tudo. Estava atrás de você no semáforo. Que ma-ra-viiiiii-lha como você pedala ao lado dos carros. E ainda vai assim de saia…

A admiração da motorista foi aumentando à medida em que eu, feito um pavão que vai abrindo lentamente a sua cauda para ver a cara de espanto do outro, explicava que a bicicleta é meu meio de transporte, que dá para pedalar de salto alto, ir ao supermercado, à festa, ao trabalho, e que um dia ainda vou subir a rua Caiubi com a força das minhas pernas. Ela cada vez mais encantada e eu de mãos dadas com a minha autoestima carente, amando aquela cascata de elogios que caia sobre nós. Quem não gosta, né?

A admiração da motorista veio por uma razão bem simples: eu estava vestindo uma saia. Pedalar com esta peça, na maioria das vezes, tem esse efeito colateral de simpatia. Tenho outras histórias meio parecidas, o que me levou a concluir, de maneira absolutamente empírica, que esta peça é o meu “cinto de segurança” na bicicleta.

É impressionante como a quantidade de taquicardias diminui radicalmente quando estou vestida assim. Não levo finas, ouço bem menos buzinas, sinto menos pressão dos carros e muito mais paciência e cuidado por parte dos motoristas. Acho que respeito também cabe aqui.

Comecei a perceber isso ao sacar que, “coincidentemente”, nos grandes sustos que levei na rua – incluindo uma fechada proposital de um ônibus na avenida Dr. Arnaldo no sentido Sumaré na semana passada, que me levou a um bate boca com um motorista -, eu estava de calça comprida e casaco de couro. E que a impaciência é ainda maior quando estou com roupa de esporte.

A conversa com algumas amigas ciclistas foi fortalecendo essa ideia, e some-se a isso os amigos ciclistas contando o quanto a briga por espaço nas ruas da cidade fica menos acirrada quando eles pedalam de camisa social. A gravata, segundo eles, tem o poder de uma redoma de vidro.

E aí eu encontrei em um estudo as pistas para, quem sabe, justificar a minha sensação de pedalar com segurança. Ele foi feito em 2006 na Universidade de Bath, na Inglaterra, para avaliar o efeito nos motoristas do uso do capacete por ciclistas. Quem conduziu a pesquisa foi Ian Walker, que além de nome predestinado ao mundo da mobilidade ativa, estuda a psicologia no trânsito. Um computador com um sensor de distância ultra sônico foi acoplado a sua bicicleta para medir com qual distância os carros ultrapassavam ciclistas com ou sem capacete. Foram avaliadas 2.500 ultrapassagens na cidades de Bristol e Salisbury, das quais parte com capacete e parte de cabeça livre. A conclusão foi que os carros, em média, passavam a uma distância de 1,33 metros dos ciclistas – apenas para constar, a margem de segurança de distância de um ciclista é de 1,5 metros. Quando Walker estava sem capacete, os carros o ultrapassavam 8,5 cm mais distante do que quando estava com a cabeça protegida. Ou seja, os motoristas eram mais respeitosos quando o ciclista não usava capacete.

O pesquisador quis testar outra teoria e foi essa a que mais me interessou. Ele vestiu uma peruca longa e saiu para fazer o mesmo estudo. Dessa forma, a distancia nas ultrapassagens era ainda mais distante, de 14 cm. Mas a questão é o que leva um motorista a ter essa postura? Se você está pensando que são homens e que isso é uma cantada, nem vem! Não é o caso mesmo. Até porque desperta a simpatia de motoristas. Será que o feminino abre a caixinha da bondade nas pessoas (ei, isto foi uma ironia)? O Dr. Walker espera descobrir em novos estudos se existe a percepção de que as meninas são ruim de guidão, imprevisíveis. Ás vezes tenho um palpite que a postura das mulheres na rua é menos agressiva e isso muda tudo. O que eu sei é que pedalar de saia é muito gostoso, me dá segurança e sempre conquista corações, como o da motorista naquele posto de gasolina.

Adriana Marmo

É cinquentinha, jornalista, mãe coruja de um adolescente, autora do www.ventonasaia.com e há dois anos descobriu a delícia que é usar a bicicleta como principal meio de transporte nas ruas de uma grande cidade e nas estradas.

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Adriana Marmo

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